quarta-feira, 2 de abril de 2014

"Taí Otário!!!"

Hoje, não sei por que cargas d'água, acordei lembrando de um Juri que fiz um tempo desse aí.

Era um homicídio onde meu constituinte era acusado de, juntamente com um comparsa, ter assassinado um cidadão em uma festa.

O caso pouco importa, mas vou tentar resumir rapidamente. Negócio foi o seguinte. São quatro personagens, A, B, C e D. Em certo dia, A tentou matar B, atirando várias vezes, mas como era muito ruim de tiro não acertou nenhum. Naquela oportunidade B estava em companhia de C, e os tiros quase acertaram C. Dessa forma, C, sentindo-se ofendido, convidou D para acertar as contas com A, pois ele tinha sido desrespeitoso. E assim o fizeram.

Tomaram conhecimento de que A estaria em determinada festa, dirigiram-se até o local, e chegando lá, o baile lotado, cerca de 7 mil pessoas, assim conta dos autsos do processo, 'caíram' de bala em A, matando-o no local, e logicamente, acabando com a festa.

De certo que a dúvida estava na seguinte questão, quem havia atirado, C ou D, ambos presos preventivamente há mais de um ano, sendo que D era o meu cliente.

Pra encurtar a história, fiz o Juri, e o meu cliente foi absolvido por 4 a 3.

Mas a questão é a seguinte, meu cliente estava recolhido preventivamente, e chegou ao Fórum algemado. no decorrer da sessão esteve ao meu lado sem as algemas, como determina a lei, mas terminado o Juri, embora absolvido, teria que voltar para a CCPJ (Central de custódia de presos de justiça, local onde ficam recolhidos os presos ainda não condenado) para fazer os procedimentos de praxe, e para que então pudesse ser livrado a ir para casa.

Ocorre que quando estava se preparando para ir de volta à prisão, vi que os Agentes Penitenciários que conduziam meu cliente foram logo colocando as algemas nele, eu estava ali meio distante, conversando com a família e alguns amigos, explicando como se daria o desenrolar dos fatos dali por diante, mas atento a tudo que se passava. Atento também à família da vítima, que normalmente não reage bem a uma absolvição.

Tendo observado que meu cliente estava sendo algemado, pedi licença e me dirigi aos Agentes, a fim de lembrá-los que meu cliente era inocente, e que, portanto, não havia mais os motivos ensejadores da condução com o uso das algemas. Eles de forma até meio irônica me responderam, "Ah dr., mas ele vai algemado é mesmo!", eu apenas respondi, Ah mas não vai não, não vai mesmo!

Fui até a Juíza e formalizei meu protesto, ela de lá mesmo, de onde já terminava de guardar seus pertences, apenas fez um sinal pra os Agentes, que logo atenderam, e passaram então a tirar as algemas de meu cliente.

Voltei até onde eles, me desculpando, pedi que eles compreendessem meu trabalho, dizendo que isso era direito do meu cliente, e que eles entendesse meu posicionamento, me pareceu que eles não gostaram muito, mas tiveram que cumprir a ordem.

A Súmula Vinculante de nº. 11 editada pelo STF é clara e inequívoca, veja:

Só é lícito o uso de algemas em caso de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado

Ora, e como é fácil de se entender, como é que se pode imaginar que alguém que acaba de ser absolvido vai ter vontade de fugir?! Realmente os Agentes estavam errados, e por isso tiveram que atender à determinação judicial, a pedido da Defesa, claro!!!

Não sei se lá na frente eles não iriam parar a viatura e algemar ele novamente, mas que do fórum ele saiu sem as algemas, ah saiu!!!

Pois quando eles terminaram de tirar as algemas do rapaz, ele com um ar de vitória e todo seguro de sí, soltou para os agentes. "Taí otário!!!". Olhei pra ele e disse, rapá tu não tem jeito mesmo!

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