quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Filme relembra ataque homofóbico c/ lâmpada na Paulista

Filme reencena ataque homofóbico com lâmpada na avenida Paulista

"Bate com vontade", orientava o diretor. "Bateu, vira a cabeça e fecha o olho."

Já passava das duas da manhã de uma noite fria de abril quando o ator Vinícius Pimentel quebrou uma lâmpada fluorescente numa cabeça de silicone montada no set de filmagem. Com o barulho do vidro estilhaçando --foram três lâmpadas estouradas até a cena ficar perfeita-- pessoas apareciam assustadas na janela dos prédios numa rua da Bela Vista.

Não era uma briga de verdade, como o ataque homofóbico que aconteceu na madrugada do dia 14 de novembro de 2010, quando um grupo de amigos foi agredido com lâmpadas na avenida Paulista.

Agora, o crime é reencenado num curta-metragem do cineasta Daniel Grinspum, que gravou cenas na Paulista, na rua Augusta e outros pontos do centro de São Paulo.

"Laio", filme que deve estrear em festivais no segundo semestre, não tenta só reconstituir o episódio. Grinspum desloca o foco das vítimas para os algozes. Toda a ação é narrada do ponto de vista do agressor, um garoto que sai para se distrair com os amigos numa sexta à noite e acaba liderando um espancamento.
 "É um exercício de reflexão, olhando para os dois lados da moeda", diz Grinspum à Folha.

"Meu desejo é discutir a situação. Só apontar culpados é importante, mas existem outras coisas por trás. Tem skinheads e evangélicos loucos que pregam a homofobia radical, mas também tem um preconceito quase natural. A gente vive numa sociedade homofóbica, e esses atos são reflexo disso. O filme não deixa de tratar os gays como vítimas dos ataques, mas é sobre por que eles acontecem."

Essa busca pela origem do mal também está no nome do curta. Na mitologia grega, Laio é o pai de Édipo, amaldiçoado a ser morto pelo filho por ter se envolvido com outro homem. Grinspum e a roteirista do filme, Nalu Béco, revisitam o mito na tentativa de explicar o que leva alguém a cometer esses ataques. "A ideia não era vilanizar o protagonista", diz Béco. "É traçar um perfil dele."

"O que mais me tocou nessa história é que o pai de um desses meninos que bateu era envolvido com teatro, com cultura", conta Grinspum. "Aquilo me chocou porque mesmo vivendo num mundo de cabeças mais abertas esse menino ainda fez isso. Não é a imagem do homofóbico que eu tinha."

No filme, são todos garotos de 17 e 18 anos, brancos e bem vestidos, que atacam um casal de gays. Giovanni Gallo, que interpreta o agressor, é magro, de aparência delicada, o que contrasta com a violência bruta que entrega nas cenas. "Desde o começo do filme, ele parece meio sufocado atordoado", disse Gallo, num intervalo da filmagem. "Na hora em que ele dá o primeiro soco, é mais do que só raiva. É a fúria dele descarregada."








Da Folha de São Paulo

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